Era uma vez uma trilha, uma estada de terra, de mato, de pedras irregulares, pisada, pisoteada, barrenta depois da chuva, poeirenta nas estiagens, onde crescia ervas daninhas, depois o sol as castigava. E lá permanecia ela, silenciosa e assistindo a tudo e a todos silenciosamente, iluminada quando a lua estava cheia, escura na lua minguante, admirando as estrelas ou coberta pelas nuvens ou ofuscada pela neblina, branca pela geada.
Ora passava
uma tropa barulhenta, depois um grande período de silêncio, sem que passasse
uma viva alma. Não eram muitas, apenas ela, a rua das Tropas e mais uma irmã, e
cinco travessas.
A rua das Tropas, mal tradada, mal amada, mal
traçada, estreita, difícil acesso, apenas útil e necessária aos transeuntes que
nela circulavam, estamos em anos anteriores a 1857.
Assim como a vila mudou de nome por doze vezes,
primeiro Goyo En, Curiti, Santa Tereza, Igaí, Pinhais, Campos dos Vinte Mil
Vacas, Vacaria dos Pinhais, Pinares, Alto Jacuí da Vacaria, Passo Fundo das
Missões, Nossa Senhora Aparecida de Passo Fundo e finalmente Passo Fundo. As
ruas também iam mudando de nomes.
Quando pequenos comércios ali se estabeleciam, recebeu
da pequena população um novo registro verbal, de rua do Comércio para melhor
indentifica-la.
Ah, se a rua falasse, opinasse, contasse sua versão
sobre tudo o que viu e ouviu, quanta história teria para contar, para nos encantar,
nos fazer sorrir e chorar e nos divertir.
Inerte viu o indígena criar sua família,
proprietário por direito, viu os tropeiros rumo ao rio fundo para pernoitar, viu
o caixeiro viajante, viu o que não sabia para onde ia, apenas perambulava.
Silenciosa viu o primeiro homem branco, Cabo Manoel
José das Neves, fixar residência com seus escravos e seus animais, para tirar a
paz do indígena que até então vivia feliz e a vontade.
A rua do Comércio era sem dúvida o coração da cidade
que pulsava rumo ao futuro, rumo ao progresso.
Com o passar dos tempos a rua do Comércio foi
registrada novamente e recebe o nome de Avenida Brasil.
Avenida Brasil, foi demarcada à pata de animais,
buscando boa aguada, seguros para descansar, transformando-se em pequenos
povoados ou cidades viajantes.
Viu chegar a ferrovia, viu a população aumentar, viu
seu território diminuir, viu estabelecimentos de ensino particulares, depois
públicos, viu a UPF, o avião, a Jornada de Literatura, o festival do folclore,
o Rodeio Internacional, e tantos outros.
Também viu as ruas se multiplicarem com uma
velocidade assombrosa e recebendo os mais diversos nomes para homenagear
pessoas que partiram.
Viu o que veio para somar, também viu o que veio
para destruir. Mas ela, continua lá, calada e democrática como sempre foi.
Lúcia
Martinelli
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