sábado, 15 de outubro de 2016

AVENIDA BRASIL

Avenida Brasil

Era uma vez uma trilha, uma estada de terra, de mato, de pedras irregulares, pisada, pisoteada, barrenta depois da chuva, poeirenta nas estiagens, onde crescia ervas daninhas, depois o sol as castigava. E lá permanecia ela, silenciosa e assistindo a tudo e a todos silenciosamente, iluminada quando a lua estava cheia, escura na lua minguante, admirando as estrelas ou coberta pelas nuvens ou ofuscada pela neblina, branca pela geada.
 Ora passava uma tropa barulhenta, depois um grande período de silêncio, sem que passasse uma viva alma. Não eram muitas, apenas ela, a rua das Tropas e mais uma irmã, e cinco travessas.
A rua das Tropas, mal tradada, mal amada, mal traçada, estreita, difícil acesso, apenas útil e necessária aos transeuntes que nela circulavam, estamos em anos anteriores a 1857.
Assim como a vila mudou de nome por doze vezes, primeiro Goyo En, Curiti, Santa Tereza, Igaí, Pinhais, Campos dos Vinte Mil Vacas, Vacaria dos Pinhais, Pinares, Alto Jacuí da Vacaria, Passo Fundo das Missões, Nossa Senhora Aparecida de Passo Fundo e finalmente Passo Fundo. As ruas também iam mudando de nomes.
Quando pequenos comércios ali se estabeleciam, recebeu da pequena população um novo registro verbal, de rua do Comércio para melhor indentifica-la.
Ah, se a rua falasse, opinasse, contasse sua versão sobre tudo o que viu e ouviu, quanta história teria para contar, para nos encantar, nos fazer sorrir e chorar e nos divertir.
Inerte viu o indígena criar sua família, proprietário por direito, viu os tropeiros rumo ao rio fundo para pernoitar, viu o caixeiro viajante, viu o que não sabia para onde ia, apenas perambulava.
Silenciosa viu o primeiro homem branco, Cabo Manoel José das Neves, fixar residência com seus escravos e seus animais, para tirar a paz do indígena que até então vivia feliz e a vontade.
A rua do Comércio era sem dúvida o coração da cidade que pulsava rumo ao futuro, rumo ao progresso.
Com o passar dos tempos a rua do Comércio foi registrada novamente e recebe o nome de Avenida Brasil.
Avenida Brasil, foi demarcada à pata de animais, buscando boa aguada, seguros para descansar, transformando-se em pequenos povoados ou cidades viajantes.
Viu chegar a ferrovia, viu a população aumentar, viu seu território diminuir, viu estabelecimentos de ensino particulares, depois públicos, viu a UPF, o avião, a Jornada de Literatura, o festival do folclore, o Rodeio Internacional, e tantos outros.
Também viu as ruas se multiplicarem com uma velocidade assombrosa e recebendo os mais diversos nomes para homenagear pessoas que partiram.
Viu o que veio para somar, também viu o que veio para destruir. Mas ela, continua lá, calada e democrática como sempre foi.

Lúcia Martinelli

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